CRÍTICA de "Obscuricenidades": A dança em composições



Tessitura _ Lili Lucca

Obscuricenidades palavra não encontrada no dicionário. Obscuro é a simples ausência de luz, falta de claridade. Destino obscuro. Mas Obscuricenidades, o espetáculo de dança do Corpo Cênico da UFAL, me traz um lugar de conforto pela pesquisa posta em cena e vista em dois ambientes do espaço cultural na última sexta- feira, dia 22 de março de 2019. Limito a não definir espetáculos pelo meu olhar, principalmente em se tratando de um processo de pesquisa colaborativo. Obscuricenidades traz a intenção de cenas de movimento em pesquisa, dançadas no escuro e na busca da composição pela dramaturgia da obscuridade, para o então descobrimento de gestos e tráfegos cadenciados.


O espetáculo tem a orientação da professora Kamilla Mesquita, sendo um trabalho executado de composição de todos que estão em cena, assim nos foi colocado. A ausência de luz que silencia o movimento para nossa visão, a presença da luz insípida que conduz nosso olhar para o movimento executado, movimento esse de pequenos e intensos gestos e ações. Movimento em foco e retratado que nos leva à lugares de relação com as imagens que se confeccionam. Relações essas individuais para cada um que assistiu, mas que geravam ideia de resistência da arte para os presentes no espaço, por tudo que aconteceu no momento atual ali.



A luz, que conduz não só quem dança e se movimenta em cena, mas que busca os demais ao movimento de se deslocar pelo espaço ou pelo olhar. Corpos em movimento. E corpos que dançam. Corpos que se movimentam e dançam. Juntos. Separados. Em espaços de tempos coreografados ou não. Corpos que dançam. Corpos que se movimentam. Apenas isso. E tudo isso. Como nos disse Kamilla, um dos motes dessa pesquisa é a não presença de luz no movimento e na sua execução/criação que nos traz Agamben em suas elucidações.Vejamos:

 “ contemporâneo é aquele que percebe a sombra de seu tempo como algo que lhe incumbe e que não cessa de interpelá-lo, algo que, mais do que qualquer luz, se refere direta e singularmente a ele. Quem recebe em pleno rosto o feixe de trevas que provém de seu tempo.”Agamben




 Descortinar cada sujeito ali presente e seu corpo compondo uma dança e um movimento juntos nessas sombras e livres em seus feixes de ação individual. Dançado o escuro das suas luzes e constituindo a dramaturgia do seu movimento e da sua dança. Um trabalho de contemporâneos que investigam a criação de ações em sua dança. Ver a obra e esses corpos que se embaralham na ação e que se colocam na linha de uma exposição pela ação do não ver e do ver nesse escuro. São corpos em construção de repertório e de vivências em arte que estão disponíveis para essa busca, ponderação que arte se edifica a partir de tudo, de intenções á fantasias, mas é necessário disciplina elaboração árdua e constante, para se chegar a obra de arte. Reflitam mais e avancem, há muito labuta pela frente.


E cabe a nós como público, olhar para essa obra, não de forma a procurar nela uma representação sonhadora de nossas ações cotidianas, mas sim de encarar a obra como ela é, enxergar a obra. Um movimento impulsionado de ações e gestos que se comunicam e se repelem. Estando e se colocando como um corpo/objeto de composição de cenas nesse “escuro” de dramaturgias que o público insiste e tem o hábito de nomear na busca de identificação/interpretação para si. Desaproveitamos. O resultado por si só já se revela na pesquisa constante e na condição que se propõem e tem como destino a Obscuricenidades. Uma dança em desempenho. Vamos nos permitir fechar os olhos para todas as significações representativas que costumamos contemplar e fazer, e nos possibilitar ser mais contemporâneos desses que dançam. Essa ordem do nosso olhar só está posta socialmente, VER é muito mais.

“ver é por princípio, ver mais do que se vê, é acender um ser latente.” Adauto Novaes

Vamos nos autorizar a vislumbrar pelo não manifestado. Pelo escuro. Deixar que o latente veja. Obscuricenidades. Dançar na obscuridade da composição do movimento da ação e dos gestos já é o suficiente. A pesquisa do Corpo Cênico é algo que festejamos no cenário local para artistas e alunos nas escolas de artes em Alagoas, mais do que esse lugar ser potente é um lugar de necessidade urgente e constante em nosso cenário nas artes cênicas. E que possamos continuar a ver tessituras e empoderamento de novos artistas através do trabalho grandioso que foi feito pela professora Kamilla Mesquita.

1 - AGAMBEN, GIORGIO. “O que é o Contemporâneo?” In: O que é o Contemporâneo? e outros ensaios; 
2 - Letras,Companhia- O Olhar/NOVAES, ADAUTO . De olhos Vendados.

SERVIÇO:
Espetáculos - Obscuricenidades_
Corpo Cênico- UFAL
Fotos de Bruno Ataíde
Projeto Corpo em arte: investigações criativas em dança
Coordenado e Orientação - Kamilla Mesquita 
Alunas e alunos intérpretes e criadores -  Ângela Maria da Silva Santos, Ione Maria da Silva Santos, Angélica Maria Alves, Cássia Keren da Silva Muni, Djamyson Olímpio da Silva, Fagner Rosendo de Souza Silva, Geferson Ramos de Oliveira, Jeyssi Luíza Nascimento Santos, Maria do Amparo Alves do Nascimento, Thatiana Alves Machado e Jailton de oliveira Correia.

“Estendam ás mãos já! - Narrativas Individuais para Construções Coletivas”

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