Tessitura _ Bruno Alves
A Casa Circo apresentou na noite do dia 19 de setembro o espetáculo A mulher do fim do mundo como parte da programação da Aldeia SESC Arapiraca 2019.
Uma mulher que, em um diálogo visceral e direto com o corpo, estabelece diálogo com outros corpos validando a existência de vários outros que atravessam gerações flageladas socialmente.
É sobre o corpo e a sua resistência diante das desigualdades da vida que o espetáculo nos conta. Traça uma narrativa simbólica de um corpo que é instrumento para atravessar outras histórias e ser porta-voz de sua existência no mundo.
São muitos corpos que Ana carrega no seu. Reflete principalmente as existências que foram e são violentadas seja pelo estado ou pelo convívio social.
Precisamos ressaltar que esse corpo, que nos comunica e rompe as barreiras da geografia deste país através do projeto Palco Giratório, é um corpo amapaense, estado onde o grupo reside e representa nessa circulação, o primeiro grupo em mais de vinte anos de projeto a representar o Amapá pelo Brasil.
E por ser um corpo que atravessa o Amapá para nos comunicar e nos fazer reconhecer, ou re-existir, torna-se muito significativo e importante dentro desse contexto de violência e extermínio social.
É um espetáculo político, sim, mas em múltiplos aspectos e maneiras. Político por representar um estado que pouco conhecemos. Político por narrar com o teatro e a dança a vida que resiste diante das desigualdades sociais desse país. É também político, principalmente, por trazer à cena, como protagonista, uma mulher negra.
Na etimologia da palavra “protagonista”, encontramos as possíveis origens:
“Vem do grego prōtagōnistḗs,oû, que combate na primeira fila; o que desempenha o papel principal em uma peça teatral'”.
Ana se dispõe ao combate na primeira fila quando coloca seu corpo na fronte dessas discussões. É ela ali a mulher que representa o começo de um novo tempo e vem, sim, para decretar o fim do mundo, principalmente o fim de ver corpos dominadores contando ou silenciando uma história que é sua.
O texto do espetáculo é rico em força e potência. Cada frase que ela solta é capaz de nos transportar para a necessidade do combate cotidiano. Esse mesmo texto é complementado por uma luz que recria o espaço e atravessa rios e florestas, fazendo o público presente ir para muitos lugares.
Ana já foi bailarina clássica, hoje está em diálogo com a dança contemporânea e, ao vermos seu corpo em movimento, temos a construção da imagem de uma guerreira, de um orixá que vem da floresta para combater por todos os espaços.
Ana sabe que sua dança é combate. Sabe também que seu corpo ao longo desse ano atravessará palcos historicamente dominados por corpos brancos. Sabe que, quando está ali, já não é mais um corpo, mas uma multidão.
Espetáculo: A Mulher do Fim do Mundo
Cia Casa Circo (AP)
Fotografia: Frederico Ishikawa
Revisão: Felipe Benicio
Revisão: Felipe Benicio
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